O Código Florestal Brasileiro e a Economia
Verde (que de verde só tem o nome)
O capitalismo, hoje, passa por uma crise no centro
capitalista - EUA, Europa, Japão – que segue se aprofundando (característica intrínseca
ao sistema capitalista, que passa por altos e baixos sempre se reinventando com
novas alternativas para manutenção do sistema). Esta crise se trata de uma
crise de superprodução, isto é, a causa dela é o acirramento de uma tendência
do capitalismo em produzir um desenfreado aumento da capacidade produtiva na
busca de lucro, ultrapassando seus próprios limites de consumo e implicando na
diminuição do ritmo de acumulação e no desemprego dos trabalhadores. Nesse momento,
toma frente junto ao desenvolvimento econômico da sociedade capitalista, um debate
ambiental que cria e defende diretrizes para construir o que se convencionou
chamar de desenvolvimento sustentável. Porém, o imperialismo continua sua busca
por recursos naturais explorando de forma predatória para promover acumulação
de riqueza, tendo governantes como aliados avançam cada vez mais sobre nossas
reservas naturais esgotando-as e promovendo diversos passivos ambientais e
sociais legitimados por reformas na política ambiental dos países.
A mais nova cara que o capitalismo vem tomando é a cara
do Capitalismo Verde. O capitalismo verde nada mais é do que a apropriação do
debate ambiental pelo capitalismo, que se utiliza de um certo “terrorismo
ambiental” gerado pelas grandes mídias. Essa é uma alternativa encontrada que
contribui para a superação da crise econômica sem modificar as bases e raízes
dos problemas sociais e ambientais existentes, mantendo o mesmo modo de
produção e mesma estrutura da sociedade. Dessa maneira, se ‘pinta’ tudo de
verde tirando o foco da origem dos problemas.
Além disso, as Transnacionais têm importantes papéis na
consolidação da Economia Verde e, principalmente, nos seus lucros. A Economia
Verde é mais uma ferramenta de acumulação de capital para estas empresas. Para isto,
a legislação ambiental brasileira constitui um grande entrave, portanto,
percebe-se os grandes interesses em modificação dessas leis. Portanto, não
podemos entender a mudança ocorrida no código florestal brasileiro como fato
pontual, mas como parte de uma política muito maior de desmonte da nossa
legislação ambiental, que visa contribuir na acumulação de capital
especulativo.
Essa opção de
política ambiental via o concurso de instrumentos de mercado tem sido
denunciada por entidades da sociedade civil, entre outras razões, por suas
implicações éticas e políticas ao estabelecer a mercantilização e
financeirização do patrimônio natural do país. Ou, no limite, pela
transformação de bens comuns do povo brasileiro em alternativa rentista para o
capital especulativo internacional, transformando em mercadorias nossas
riquezas naturais, tornando tudo valorável.
Contudo, outra
derivação desses instrumentos, igualmente desastrosa, e que não aflorou nos
debates no Congresso, diz respeito à tendência de perpetuação das anomalias da
estrutura fundiária do país, inclusive, com rebatimentos práticos na
neutralização dos comandos constitucionais e legais que orientam as possibilidades
da reforma agrária.
No texto publicado
no site do instituto Terra de Direitos, consta a reportagem de Gerson Teixeira
(Engenheiro Agrônomo,
ex-presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária): “Latifúndios improdutivos viraram
fábricas de carbono”. Também consta a reportagem de Guilherme Costa Delgado (doutor em economia pela UNICAMP e consultor da Comissão Brasileira de Justiça e Paz), “Economia
verde-financeira associada ao novo código florestal aumenta caos fundiário e
ambiental”.
Segue abaixo a
reportagem:
Economia verde e alterações no Código Florestal facilitam a internacionalização da terra
Segundo
Gerson Teixeira, a possibilidade de comprar créditos de carbono transformará os
latifúndios improdutivos em “fábricas de carbono”.
Artigos
recentemente publicados por Gerson Teixeira, ex-presidente da Associação
Brasileira de Reforma Agrária (Abra), e Guilherme Costa Delgado, consultor da
Comissão Brasileira de Justiça e Paz, tratam das conexões entre a reforma
agrária e a titulação de terra com os novos mecanismos da economia verde,
aprovados no texto do Código Florestal.
Gerson
Teixeira aborda a alteração no Código Florestal, no Art. 41, parágrafo 4, que
institucionaliza os Títulos de Carbono e Cotas de Reservas Legais como
mecanismo de comércio de crédito de carbono. Segundo Teixeira, a possibilidade
de comprar créditos de carbono transformará os latifúndios improdutivos em
“fábricas de carbono e em repositórios de reserva legal”, assegurando
falsamente a função produtiva e o respeito ao meio ambiental.
Um agravante à
instituição de Títulos de Carbono e Cotas de Reservas Legais, segundo Delgado,
é a possibilidade de negociação em Bolsas de Valores ou de Commodities, onde os
títulos serviriam de caminho para a internacionalização do mercado de terras.
Diante da
gravidade das possíveis conseqüências trazidas com os mecanismos da economia
verde, associados às alterações propostas para o Código Florestal Brasileiro,
Teixeira afirma que a Abra dará centralidade ao debate do tema e aponta a
necessidade de haver pressão para que não sejam aprovados tais mecanismos no
Código.
Confira os
artigos:
–
Gerson Teixeira: latifúndios improdutivos viraram fábricas de carbono
Fonte:
site do MST, por Gerson Teixeira*, publicado em 26 de junho de 2012.
De um modo
geral, os setores de esquerda ‘passaram batido’ com a armadilha fundiária e
territorial contida no texto do ‘Novo Código Florestal’ aprovado pelo
Congresso, fruto das ações dos ruralistas e das entidades do ambientalismo de
mercado, com o aval entusiasmado do capital financeiro.
Trata-se dos
desdobramentos sobre a estrutura agrária, da institucionalização do comércio de
florestas para fins de compensação dos passivos de reserva legal até 2008, e da
utilização de áreas protegidas (APP e RL), no mercado de carbono, conforme os
arts. 4º e 9º, da Lei de Mudanças Climáticas combinados com o art. 41,§4º, do
‘Novo Código’. Em ambos os casos visa-se os mercados interno e internacional.
Essa opção de
política ambiental via o concurso de instrumentos de mercado tem sido
denunciada por entidades da sociedade civil, entre outras razões, por suas
implicações éticas e políticas ao estabelecer a mercantilização e
financeirização do patrimônio natural do país. Ou, no limite, pela
transformação de bens comuns do povo brasileiro em alternativa rentista para o
capital especulativo internacional.
Contudo, outra
derivação desses instrumentos, igualmente desastrosa, e que não aflorou nos
debates no Congresso, diz respeito à tendência de perpetuação das anomalias da
estrutura fundiária do país, inclusive, com rebatimentos práticos na
neutralização dos comandos constitucionais e legais que orientam as
possibilidades da reforma agrária.
O
esclarecimento dessa hipótese requer, antes, uma breve abordagem sobre esses
novos ‘negócios verdes’ que caem como luva nas ideias da ‘economia verde’
conforme os conceitos mais atrasados que circularam na ‘Rio + 20’, felizmente
rechaçados pelo governo brasileiro.
A partir da
plena eficácia da Lei, bolsas de mercadorias e futuros, bolsas de valores e
entidades de balcão organizado, estarão habilitadas a operar no mercado
mobiliário, Títulos de Carbono e Cotas de Reservas Legais – CRAs, que inserem,
principalmente a floresta amazônica brasileira, com suas terras e
biodiversidade, no circuito da globalização financeira.
Será possível,
neste florescente comércio, eufemisticamente caracterizado como de prestação de
serviços ecossistêmicos ou ambientais, ganhos financeiros cumulativos com
operações com os dois títulos de crédito sobre uma mesma base física de
negócio, i.e, sobre um mesmo imóvel rural. E, neste, parte correspondente dos
títulos de carbono poderá estar sob o controle de uma empresa na China, e parte
equivalente das cotas de reservas ambientais, sob o controle de uma empresa
madeireira filipina. Enfim, são bens comuns tangíveis e intangíveis, que passam
a se somar às commodities convencionais do agronegócio brasileiro, cada vez
mais sob o controle do capital financeiro.
Estão
elegíveis para o mercado de carbono, as atividades de manutenção das APP, de
Reserva Legal, e de uso restrito, as quais, nos termos da nova legislação,
configuram ‘adicionalidade’ para fins de mercados nacionais e internacionais de
reduções de emissões certificadas de gases de efeito estufa.
As cotas de
reservas ambientais, na proporção de uma cota para um hectare de floresta,
serão lastreadas por área sob regime de servidão ambiental; áreas excedentes às
reservas legais; áreas de Reserva Particular do Patrimônio Natural – RPPN; e
áreas particulares localizadas no interior de Unidade de Conservação.
Ademais,
caracterizando concessão duvidosa para compensar a agricultura familiar pela
eliminação da isenção de reserva legal, prevista no Relatório Aldo Rebelo, a
Lei prevê que as reservas desses imóveis sejam utilizadas como cotas
ambientais. Considerando os dados do Censo Agropecuário de 2006, significa que
perto de 4.9 milhões de hectares de matas nativas das reservas legais dos
estabelecimentos familiares poderão justificar a manutenção de área potencial
de igual magnitude, do passivo, até 2008, das reservas dos grandes imóveis. Sem
dúvidas, haveria formas mais aceitáveis para o legítimo estímulo de práticas
sustentáveis pela agricultura familiar.
O fato é que
essas novas possibilidades de negócios tendem, também, a blindar o latifúndio
improdutivo da desapropriação para fins sociais. E mais: tendem a subverter o
conceito constitucional da função social exigido dos imóveis rurais.
Com efeito,
latifúndios improdutivos serão transformados em fábricas de carbono e em
repositórios de reserva legal, o que lhes assegurará função produtiva e
virtuosismo ambiental. Imagine-se um mega latifúndio na Amazônia de 50 mil
hectares, no caso, com toda a floresta originária preservada.
O seu titular,
proprietário ou posseiro, poderá fazer excelentes negócios no mercado de
carbono em cima de 40 mil hectares, e os outros 10 mil hectares serão
transformados em 10 mil cotas de reserva ambiental para compensar os passivos
de reservas de outros imóveis. Pergunta-se: esse latifúndio poderá ser
desapropriado?
Obviamente
não, pois, por exemplo, a área de floresta excedente à reserva estará alienada
para as finalidades de compensação de reservas de outros imóveis. Observe-se
que o art. 50 da Lei, dispõe sobre as hipóteses de cancelamento das cotas de
reserva ambiental entre as quais não figura a desapropriação.
É provável
que, pelo efeito desses instrumentos, a mensuração da produtividade de um
imóvel passe a exigir nova metodologia de cálculo do Grau de Utilização – GU, e
do Grau de Eficiência da Exploração – GEE, de modo a incluir os novos e
‘virtuosos’ atributos desse latifúndio. Ou mesmo, que ao GU e GEE venha a ser
adicionado o GCAC (Grau de Cotas Ambientais e de Carbono).
Nem mesmo os
representantes do latifúndio contavam com esse presentinho batalhado pelos
ambientalistas de mercado. Afinal, além dos novos grandes negócios, estarão
livres de ações involuntárias de reforma agrária à medida que as suas extensas
áreas improdutivas terão um up grade moral com as suas transformações em
reservas de excelência ambiental e climática.
Não bastasse
tais consequências, com as lacunas da Lei esses instrumentos poderão ser
utilizados para o processo de ‘esquentamento da grilagem de terras’ em larga
escala, notadamente na Amazônia. Assim, não será surpresa a inclusão, pelo
IBGE, num futuro próximo, das informações sobre a posse e o uso dos milhões de
hectares do território brasileiro, atualmente ocultos, pois não registrados
pelo nosso órgão de pesquisas geográficas.
Em suma, esse
tema, de dimensão estratégica para o Brasil passou despercebido no processo que
resultou no texto ainda não definitivo do Novo Código Florestal. A Associação
Brasileira de Reforma Agrária (Abra) dará centralidade à discussão do assunto
por ocasião do seminário que promoverá em Brasília nos próximos dias 28 e 29.
Ainda há tempo
para que os partidos de esquerda, em especial o PT, atuem sobre a MP nº 571, de
2012, de modo a tentar evitar as piores sequelas dos negócios verdes que
projetam cenários torvos para o Brasil.
*Gerson
Teixeira e Engenheiro Agrônomo, ex-presidente da Associação Brasileira de
Reforma Agrária
————————–
Economia verde-financeira associada ao novo código florestal aumenta caos fundiário e ambiental
Fonte:
Correio da Cidadania, por Guilherme Costa Delgado*, publicado em 17/07/2012
Há poucos
dias, o atual presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária (ABRA),
Gerson Teixeira, chamou atenção em artigo veiculado pela internet para uma
mudança introduzida pelo novo Código Florestal (Art. 41, parágrafo 4), que
institucionaliza os Títulos de Carbono e Cotas de Reservas Legais como
mecanismo de comércio de crédito de carbono, instrumento financeiro que se
propõe a vender excessos de oxigênio gerados pelas florestas nacionais em compensação
aos setores emissores líquidos de dióxido de carbono na atmosfera.
Essa
iniciativa, analisada sob os enfoques fundiário, ambiental e internacional, a
depender da implementação que venha a ter, contém riscos sociais enormes, que
provavelmente passaram desapercebidos, exceto pelos espertos caçadores de
oportunidades a qualquer custo. Vamos tentar traduzir para o leitor esses
riscos, associados à via financeira da economia verde e da sua conexa internacionalização
do mercado de terras, que a nova norma do Código Florestal pretende introduzir.
Títulos de
Carbono e Cotas de Reservas Legais são títulos patrimoniais novos, que
‘proprietário e possuidores’, conforme o texto legal, uma vez emitindo-os,
convertem o ativo real a que se reportam (território florestal sob comércio) em
direito de propriedade do comprador. Negociados em Bolsas de Valores ou de
Commodities, tais títulos seriam via certa e direta da internacionalização do
mercado de terras, principalmente das terras de vasta cobertura florestal
natural – a Amazônia Legal brasileira em especial, mas não apenas. A avaliação
financeira desses créditos/débitos de carbono irá depender evidentemente do
‘valor’ que esse comércio venha a alcançar no mercado global.
Por outro
lado, títulos patrimoniais para negociação no mercado financeiro requerem
titularidade legal reconhecível, sob pena de a transação envolvida não se
efetivar. Aí reside um grave problema brasileiro, de natureza fundiária, que
está envolvido na questão. A titularidade da esmagadora maioria dos territórios
das florestas em Parques e Reservas, Terra Indígena e Terras Devolutas, é da
União ou dos estados, não obstante em toda essas áreas públicas haver intrusão
de grileiros e em pequenas dimensões de posseiros familiares. Essas terras
públicas, para entrarem no mercado financeiro, no formato que o Código
Florestal institui, precisariam ser privatizadas legalmente, para somente então
serem financeirizadas e internacionalizadas.
Esse processo
que a economia verde de vertente financeira persegue ignora absolutamente a
situação agrária do país, a população camponesa e, por que não dizer?, também o
meio ambiente. Isto porque crédito de carbono emitido a partir do fato natural
(absorção de dióxido e emissão de oxigênio) não envolve nenhum trabalho humano,
mas sim a captura de uma renda fundiária ambiental mundial, por conta de uma
ilegítima apropriação privada do território. Tampouco melhora a situação
ambiental das regiões nacionais de agricultura avançada, que também poderiam
compensar seus débitos com compra de títulos no mercado financeiro.
É necessário
olhar com muita cautela a regulamentação deste texto legal (Código Florestal).
Isto porque muito astutos de ocasião, percebendo um pouco a exaustão do ‘boom
da commodities’ que caracterizou o ciclo expansivo primário-exportador da
última década, podem estar tentando ensaiar um movimento tìpicamente financeiro
de internacionalização do mercado de terras, sob etiqueta verde.
Aparentemente,
o governo Dilma encampou desapercebidamente a jogada dos verdes de vertente
financeira. Terá a oportunidade da regulamentação legal para colocar freios na
especulação mais escandalosa, sob pena de produzir uma enorme confusão
fundiário-financeira. Até certo ponto, a desordem de titularidades fundiárias
no país como um todo e na Amazônia Legal em particular são um sério obstáculo à
perpetuação da engenharia financeira preconizada no Código Florestal. Mas como
bem observou o competente geógrafo Ariovaldo Umbelino, uma nova Lei de Terras,
à imagem e semelhança daquela de 1850, pode ser o sonho ruralista para realizar
essa nova vertente financeira do mercado de terras.
*
Guilherme Costa Delgado é doutor em economia pela UNICAMP e consultor da
Comissão Brasileira de Justiça e Paz.
Saiba
mais sobre o tema:
1. “Pagamento por Serviços
Ambientais e Flexibilização do Código Florestal para um Capitalismo Verde”,
por Larissa Packer, publicado pela Terra de Direitos em agosto de 2011.
2. “Quem e quem perde com REDD e
PSA”, documento do Grupo Carta de Belém de novembro de 2011,
publicado em fevereiro 2012.
3. “Como funciona o Capitalismo “Verde”: mecanismos
jurídicos e financeiros preparam o Brasil para um novo modelo de acumulação”,
por Larissa Packer, publicado na coletânea Um Campeão visto de perto – uma análise
do modelo de desenvolvimento brasileiro.
Confira a
reportagem na íntegra no site:
Publicado por:
Camila Traesel Schreiner
era para ser um livro, ninguém me avisou.
ResponderExcluirSe tu digitares no google esta frase que tu reproduziu no teu texto sem referência à fonte ("Essa opção de política ambiental via o concurso de instrumentos de mercado tem sido denunciada por entidades da sociedade civil"), você vai ver que os 10 links que aparecem na primeira página, usam a mesma frase, em um processo alucinante de "clonagem" de idéias. Outros trechos do teu texto apresentam o mesmo problema (claro que não me refiro àqueles trechos retirados de outros sites com a devida referência da fonte). A idéia está legal, o argumento perfeito, mas esta "apropriação" indevida do texto dos outros compromete totalmente a qualidade do teu texto!
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